15.10.04
"O erotismo é a aprovação da vida até na morte"

"Acredito que o erotismo é a aprovação da vida até na morte. A sexualidade implica na morte, não somente no sentido de que os recém-chegados prolongam e substituem os desaparecidos, mas porque ela faz entrever a vida do ser que se reproduz. Reproduzir-se é desaparecer, e os seres assexuados mais simples se sutilizam ao se reproduzirem. Eles não morrem, se pela morte se entende a passagem da vida à decomposição, mas aquele que existia, ao se reproduzir, deixa de ser aquele que era (pois se torna duplo). A morte individual é apenas um aspecto do excesso proliferador do ser. A reprodução sexuada é em si mesma apenas um aspecto, o mais complicado, da imortalidade da vida garantida na reprodução assexuada. Da imortalidade, mas ao mesmo tempo da morte individual. Animal algum pode aceder à reprodução sexuada sem se acabar no movimento cuja forma acabada é a morte. De qualquer maneira, o fundamento da efusão sexual é a negação do isolamento do eu, que só conhece o desfalecimento ao se exceder, ao se ultrapassar no abraço em que a solidão do ser se perde. Quer se trate do erotismo puro (de amor-paixão) ou de sensualidade de corpos, a intensidade é maior na medida em que a destruição, a morte do ser transparecem. O que se chama de vício decorre desta profunda implicação da morte. E o tormento do amor desencarnado é tanto mais simbólico da verdade última do amor quanto a morte daqueles que ele uniu os aproxima e os enternece. Nenhum amor entre seres mortais..."

Georges Bataille. A literatura e o mal.

[Ouvindo: Norah Jones - Come Away With - - (3:05)]

0 comentários:

SaravaClub*. Tecnologia do Blogger.