3.6.04
"O coração é uma casa de putas: Tem muitos quartos.
(Gabriel Garcia Márquez)

O amor são negócios.
São ações,
investimentos,
onipresença desejada
mas impossível.

O amor é gripe.
Conhecemo-lo por inteiro, sabemos de seus caminhos,
mas sempre adoecemos.
O amor é ainda pior que a gripe,
porque nele nós insistimos.
Seria talvez mais sensato ter gripe que amar.

O amor é curto e bruto.
Soca tudo para dentro de seu tamanho,
e lá dentro é tão pequeno.
Como não sair machucado
de limites tão estreitos?

O amor tem cheiro,
ninguém ama o que fede.
O amor é cheio de frescuras.
Quer flores
e quer ser entendido.

Há gente que acha que amor
são dois cubos lado a lado.
Há quem ache que são engrenagens justapostas.
Há quem não saiba o que fazer
do próprio amor,
e há os que não o conhecem
e nem por isso morrem.

Somos todos tão esquisitos.
Amamos e morremos de medo,
ou então amamos e temos mil coragens,
ou então estamos sempre a um pezinho só
do amor e olhamos para os lados,
perguntando:
"Ninguém vai fazer nada?
Ninguém vai me dar uma mão com isto aqui?"
O amor vive dizendo:
"se vira".

O amor nem sempre pára na rua
pra nos cumprimentar. Às vezes chegamos
esbaforidos num lugar, e ele acabou de sair.
O lugar onde se sentou ainda está quente,
a marca de sua bunda, em forma de coração,
ainda é visível,
mas estamos atrasados.
Noutras vezes, chegamos cedo demais,
e nos enchemos e vamos embora
antes que ele apareça - se é que aparece.

Às vezes nos apaixonamos pela idéia que fazemos do outro.
E o amor reconhece sua firma,
e diz que é legítimo e autenticado - penas
talvez seja breve.
Às vezes o amor é tão curto
que dá a aparência de engano.
Culpamos o amor por tudo.

Às vezes o amor vem vestido de fome,
de falta; às vezes nem dá nome na porta,
entra quieto, tira os sapatos, olha pros lados,
e voilá! estamos ferrados.
E às vezes o amor vem todo pintado,
fazendo escândalo e bebendo muito, subindo
nas mesas, dançando, piscando para tudo
e para todos, soltando baforadas safadas,
borrando o batom.

Às vezes vem como chuva,
penetra nossa pintura
e nos molha os olhos
ou enche nossa barriga de formigas.
O amor nos deixa ansiosos,
dependentes do relógio,
donos dos meses sem fim
entre desgostos mais ou menos óbvios.

Nunca acordei amando,
mas já fui dormir assim muitas vezes.
Nunca perdi a fome,
mas já cansei de perder o sono.
Nunca recuperei nada.
Já olhei muitas manhãs com cara de última,
já desci muitas ruas que tinham ar de fim da linha,
já me senti vezes sem conta irmão das poças.
Já bebi muitas auroras
em companhias mortas.
Já fui expert em cinzas.

E o amor vive comigo.
Tenho dois corações:
um é meu, com licença, que alguém tem que ser
constante a meu lado;
o outro tem donos variados.
O amor o aluga
a gente esquisita,
a uns fodidos, mal-amados;
mas também o loca
a gente maldita, que é bela, bonita e boa,
que me faz rir e achar bom
não ser mais dono do que penso - essa gente
que me mata
em cada ponto final
que resolve inventar.



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